Uma idosa de 66 anos que viveu mais de 50 anos no hospital Beneficência Portuguesa de Araraquara, no interior de São Paulo, depois que foi atropelada quando criança, foi adotada pela cuidadora de idosos Glaucia Andressa Santos Gomes, de 30 anos. A moça levou dona Cotinha para a casa em 2017 e agora deu a senhora documentos e o sobrenome Santos Gomes, o mesmo da mãe adotiva.Gláucia, de 30 anos, trabalhou por anos no hospital e lá cuidava de Cotinha. Ela conta que a idosa chegou à instituição acompanhada do irmão de quatro anos, ambos acidentados. “O irmãozinho faleceu e ela ficou lá internada. Naquela época as freiras que tomavam conta e então ela foi criada por elas”, disse.“Quando o hospital fechou ninguém quis ficar com ela. Eu vi que, se eu abrisse mão dela, ela ia ficar em um asilo, sem saber onde. Eu não podia fazer isso. Ela só tinha a mim na vida dela”, afirmou Gláucia. A cuidadora levou Cotinha para casa em 2015 e desde então tenta regularizar a situação da idosa, mas a falta de documentos era um empecilho.Cidadã brasileiraO nome Cotinha foi escolhido pelos funcionários do hospital, porque o verdadeiro nome dela nunca foi descoberto. Cotinha tem algumas deficiências e não sabe falar. Ela viveu todo esse tempo sem documento, como indigente dentro do hospital. Por meio da ajuda de duas advogadas, finalmente a Cotinha conseguiu este mês um documento de identidade e ganhou sobrenome. As advogadas também conseguiram uma certidão de nascimento. A data escolhida foi 12 de outubro porque era no dia das crianças que os funcionários do hospital comemoravam o aniversário de Cotinha.“Não tem filiação na certidão de nascimento dela e colocar um sobrenome qualquer a gente falou que não teria necessidade se hoje a mãe dela de fato é a Gláucia. Aí usamos desse princípio da afetividade para que contasse o sobrenome “dos Santos Gomes”, que é o sobrenome da Gláucia, na certidão de nascimento da Cotinha”, explicou a advogada Giulia Negrini. Gláucia conta que a documentação trouxe mais qualidade de vida para a idosa e toda família. “Hoje posso viajar com ela. Imagina se eu fosse viajar com ela sem documento? Hoje eu posso ir para qualquer lugar. Ir ao cinema, ela paga metade [do ingresso] (risos).”Agora falta a adoção definitiva.O processo de adoção pode ser longo e as advogadas entraram com um pedido especial. “A lei não tem essa previsão da adoção inversa. O adotante tem que ter 16 anos a mais do que o adotado. Então o próximo passo é conseguir essa adoção inversa para que a Gláucia figure na filiação da Cota”, explicou a advogada Adriele Teixeira.Hospital virou casa após acidenteEu vi aquela senhora limpando mesas e achei que fosse mais uma funcionária”, contou Glaucia. De acordo com o G1, mais tarde ela descobriu que Cotinha, ou Cota, como prefere chamá-la, morava há muito tempo no hospital. Cotinha vem de Cota, apelido dado antigamente às mulheres de nome Maria. Ninguém sabe qual o nome verdadeiro da mulher, nem sua idade, nem mesmo quando ela chegou ao hospital.O que contam é que ela chegou ao hospital ainda criança, junto com o irmãozinho que tinha uns 4 anos, vítimas de um atropelamento por caminhão. O irmão teria chegado morto e ela totalmente enfaixada, apenas com os olhos aparecendo. “O pessoal fala que foi um acidente perto do [bairro] Quitandinha. Falam que quando ocorreu o acidente ali ainda não tinha o pontilhão que tem hoje. Como o pontilhão tem em torno de 50 anos, a gente acredita que ela tem entre 62 e 65 anos”, disse Glaucia. “Dizem ainda que ela ficou seis anos enfaixada, internada no hospital, período que teria sofrido muitas dores”, completou. A origem de Cotinha, as circunstâncias como ela chegou ao hospital e o porquê de ter morado tanto tempo lá são desconhecidas.As poucas informações que existem sobre ela foram passadas boca a boca por funcionários, sem ter como comprovar sua veracidade. Ao longo dos anos, muitas pessoas trabalharam no hospital e todos conheceram a história de Cotinha lá. Acreditam que as freiras que faziam o atendimento do hospital na época que ela chegou se sensibilizaram com a sua situação e, como nunca ninguém a procurou, passaram a cuidar dela. “Contam que ela trabalhava ajudando as irmãs, principalmente uma que se chamava Tereza. Dizem até que dormiam no mesmo quarto”, afirmou Glaucia.
Após adoção, idosa que viveu 50 anos em hospital ganha sobrenome
Redação,
28/03/2019 às 03:00 •