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Casamento de transexual com italiano era para ser o 1º em MS, mas virou confusão

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(Foto: Divulgação)
Dois meses de inferno. É assim que o italiano que veio ao Brasil se casar com a transexual resume. Ela é campo-grandense e cabeleireira, ele, advogado, nascido na Itália. Os dois vivem juntos como marido e mulher desde janeiro de 2014, em Lisboa, Portugal. O casal prefere não se identificar, mas narra uma trajetória que virou do avesso o sonho do altar. Como se não bastasse a burocracia de esperar dois meses para ter a certidão de casamento em mãos, eles acabaram passando quatro horas na prisão, e garantem que até hoje nem sabem o motivo.Como a cabeleireira é turista na Europa, os dois decidiram vir à cidade natal dela para se casar no papel. O casal se conheceu pela internet, depois que ela se mudou para Portugal.Munidos de toda documentação, os dois relatam que chegaram em maio e deram entrada no cartório para a união estável. Três dias depois, foram novamente, dessa vez, para fazer a conversão da união em casamento. Segundo eles, o primeiro caso de um trans com um estrangeiro na Capital. Mas nada deu certo.O casal teve de procurar o MPE (Ministério Público Estadual) e o MPF (Ministério Público Federal) para conseguir a autorização da conversão. O cartório não queria aceitar o nosso casamento, só que aqui tem uma lei para converter a união em casamento. Eles não aceitavam converter a união homoafetiva, explica a campo-grandense.Auxiliados pela militante Cris Stefany e pelo Centrho (Centro de Referência em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia), tiveram de rebater a justificativa para não fazer o casamento, que estaria na documentação dele.O advogado afirma que toda sua documentação era legal, mas que exigiam que fosse traduzida. Mas já era em português, aqui diz onde eu moro, vem com o carimbo do governo português, já é em português, frisa o italiano.O cartório não se negou, mas também não fez nada. Dizia que precisava do registro dele com chancela do consulado, conta Cris. Creio que houve xenofobia também, se fosse brasileiro, disseram que seria fácil, completa.No cartório, o casal relata que chegou a ouvir que deveriam se casar em Las Vegas ou Alemanha, porque era mais fácil. Eu nasci aqui, moro aqui, tenho residência aqui e estamos juntos há quase três anos em Lisboa, conta a transexual.Eles planejaram ficar no Brasil durante três meses. Me comunicaram em Lisboa que a situação no Brasil não era estável, pelo impeachment e que eu encontraria burocracia e impedimentos e de fato, no Mato Grosso (do Sul), me fecharam todas as portas, elenca o advogado.No MPE, a transexual ainda relata ter passado pelo constrangimento de ser chamada pelo nome de registro e não pelo social. De lá, houve o encaminhamento do pedido ao Juizado Especial, que também negou a autorização da conversão.O casamento só foi acontecer, no papel, no dia 15 de julho, pela Justiça Itinerante e o casal justifica que foi depois de acionarem o MPF, após quatro negativas. Se é estrangeiro ou não, não importa: branco, negro, homem, chinês, africano. Nós somos todos iguais, conta indignado o marido.Mais confusão - Os planos eram de fazer uma festa em família, para comemorar o casamento no final do mês, mas a ideia mudou completamente. De quinta para sexta-feira, quando chegavam na casa que alugam, no bairro Zé Pereira, próximo dos familiares da cabeleireira, começou uma série de agressões da família para com o casal.A transexual narra que foi chamada pela mãe devido a um desentendimento passado. Ao voltarem para a casa, a porta foi arrombada pelo irmão dela que partiu para cima dos dois. A cabeleireira conta que pediu para que o marido não entrasse na discussão, porque aquela era a família dela. Meu irmão e a minha mãe começaram a bater em mim, descreve. Nas chamadas do celular do advogado, das 20h59min até 21h20min, estão registradas várias ligações para o 190. No total, nove vezes e 15 pessoas da família da cabeleireira agredindo o casal.Passada 1h, eles relatam que a Polícia chegou. A casa estava destruída e os militares levaram todos para fora. Me perguntaram de onde eu era, disse que era português, porque moro lá. E eles: mas como um português não fala e não entende português? repete o marido.A Polícia chegou e era só: cala a boca, seu filha da p..., seu merda de italiano e foram empurrando, agredindo meu marido, relata a transexual. O italiano tentava dizer que havia chamado a viatura para que o defendessem, mas conta que só ouvia cala a boca. E ela, teve o tratamento todo no masculino, desde o nome. Perguntaram como você chama, eu disse e falaram que minha identidade não era válida, que eles queriam saber meu nome, conta.Até a certidão de casamento eles dizem que a Polícia desconsiderou. Eles falavam: sai agora, quer que eu te bata? Eu pedi não, por favor conta a transexual. O marido tentava perguntar por que estava sendo levado, mas só ouvia que deveria ficar em silêncio.De vítimas que acionaram a Polícia, eles acabaram sendo levados para a Casa da Mulher Brasileira, de camburão. Eles fizeram como se tivessem pegado a gente em flagrante. Minha mãe disse que foi violentada por ele (o marido), mas não tem como. O depoimento dela nem foi constado, fala a cabeleireira.Lá eles foram levados separadamente. E segundo relatos do casal, foram quatro horas sem se ver e nem se falar. Eu falei dá-me um documento de porque está me mandando a prisão. E eles só diziam: você não é nada aqui, repete o advogado.O italiano conta que nunca tinha visto a cena nem em filmes. De que coisa está me acusando? De ter matado qualquer um? Violentado a minha mulher? questionou aos policiais. Já ela afirma que não teve nenhuma policial mulher que a acompanhasse.E eu perguntei: a gente é preso assim? Sem direito de fazer uma chamada? E me disseram que é assim no Brasil. Isso não é direito humano, avalia o advogado. O casal só foi liberado depois de assinar uma ocorrência que trazia o relato da confusão em família bem resumida.Na tarde desta sexta-feira, eles foram até a Corregedoria da Polícia Militar denunciar o caso. Eu imaginava que viria para o Brasil em paz, ver o túmulo do meu pai, casar e fazer uma festa bem grande com a família..., lamenta a campo-grandense.O marido emenda que os planos de um dia estabelecerem moradia no Brasil, acabaram. Imagina? Essa cultura? Eu que nunca fui preso, nunca me mandaram para a prisão... Não quero mais morar aqui, nunca mais..., resume. A Corregedoria da Polícia Militar de Mato Grosso do Sul informou que teve conhecimento formal do fato pelo denunciante e que os procedimentos legais estão sendo instaurados para averiguar a conduta dos policiais militares envolvidos.