Publicado em 23/04/2016 às 03:00,

Irmãs separadas da família são adotadas por casal homoafetivo e se mantêm unidas

Redação, Correio do Estado
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(Foto: Divulgação)
As lágrimas rolam fácil diante de uma história que não se ouve todos os dias por aí. Difícil conter a emoção em cada palavra que é dita com tanto sentimento, e que detalha o sonho concretizado de duas pessoas que hoje formam e vivem o que se chama: família. Juntos há 6 anos, Cezar, enfermeiro, e Rodrigo, advogado, educador físico e estudante de contabilidade, triplicaram há dois anos e três meses os motivos para seguirem unidos no relacionamento. Andreina, de 14 anos, Emily, de 11 e Maria de 2 anos e 5 meses são os mais recentes motivos de felicidade do casal.Desde o princípio, o sonho era adotar uma menina, bebê. Mas as duas irmãs mais velhas apareceram primeiro e confundiram um pouco a cabeça dos pais que aguardavam ansiosos pela tão esperada paternidade.Seguidores e praticantes da doutrina espírita, certa vez, dentro de um centro, Cezar recebeu uma mensagem de que ele teria um resgate a cumprir. Sem dar muita importância para o recado, após seis meses, por meio do processo de incorporação, Cezar e Rodrigo receberam outra mensagem.“Nos avisaram que as crianças já estavam a caminho e prontas para nos receber”, contou Cezar. Momento em que deram o primeiro passo, iniciando o curso de adoção (necessário para todas as pessoas que pretendem adotar).Os então papais enfrentaram o processo burocrático e entraram para a fila de adoção. Após o curso preparatório, passaram por testes e terapias em grupo. Só não imaginavam que em pouco tempo teriam três filhas nos braços e uma nova rotina pela frente.“Depois de nove meses que demos início ao processo de adoção, falei para o Rodrigo que achava que não íamos conseguir adotar tão rápido, já que o processo de adoção demora em torno de dois anos. Depois de quatro horas que eu falei isso o Fórum entrou em contato e pediu que eu fosse ao local. Fiquei surpreso, não pensei que pudesse ser algo positivo, fui logo pensando que o Rodrigo tinha reprovado em algum teste”.Ao chegar no Fórum, a psicóloga abriu o notebook e mostrou ao casal duas irmãs, uma de 9 e outra de 11 anos. Ela perguntou se tínhamos interesse em conhecê-las, dissemos que sim. No formulário para adoção eu escrevi que me interessaria por grupos de até três irmãos, de preferência uma menina. Na mesma hora ficamos sabendo que as meninas eram de Ribas do Rio Pardo. A coincidência foi demais porque o Rodrigo e a família toda dele é de lá, ficamos arrepiados”, ressaltou Cezar.Ao olhar para as meninas, Cezar conta que ficou meio indeciso, já que os mentores espirituais lhe disseram que ele teria um bebê. “Na hora me assustei e pensei deve ter alguma coisa errada. Mas nos comovemos e fomos conhecê-las. Ambas já sabiam que eramos um casal homossexual. Não tive aquele querer, nem aquele amor a primeira vista. Fiquei olhando para elas e me perguntava porque não era uma bebê”, explicou.A princípio o casal apadrinhou as duas crianças que passaram a frequentar a casa dos dois aos finais de semana e depois o período de férias. “Nesse tempo minha empolgação foi a mil. Passei a comprar roupas e jogo de quarto para elas. Comecei a ficar motivado”, observou.Certo dia, ao buscar as meninas no abrigo para passarem as férias, mais uma vez a espiritualidade se fez presente na vida de Cezar, que avistou de longe dois carrinhos de bebê. Em um dos carrinhos tinha uma criança, o outro estava vazio. Quando olhei para aquele carrinho vazio enxerguei uma luz muito forte saindo dele e perguntei quem estava naquele carrinho, foi quando Emily e Andreina responderam que era a irmã delas, relembrou emocionado o pai de Maria.Já com os olhos marejados e a voz embargada, ele não esconde a emoção que sente em lembrar daquele bebê indefeso, com apenas um mês e 14 dias, aguardando em um abrigo para ser entregue a uma família. “Na mesma hora eu falei que queria aquela criança. A diretora disse que a bebê estava passando por tratamento médico e que não seria tão fácil adotá-la.Com ideia fixa na cabeça e na certeza de que faltava Maria para completar a família, quase dois meses depois de que o casal já estava com as duas meninas, foram surpreendidos com a ligação da psicóloga de que eles poderiam adotar Maria.Em menos de quatro dias após entrar com a ação de guarda provisória, o casal foi buscar a tão sonhada, literalmente, Maria. “Sonhei com o nome dela antes mesmo de tê-la comigo”, contou Cezar.O processo de guarda, que pode levar até seis meses para se concretizar, nesse caso, ocorreu rapidamente.Cezar conta que desde que pegou Maria, do caminho de Ribas do Rio Pardo à Campo Grande, os olhos da menina não se desgrudaram dos dele. Cezar só foi escutar o primeiro choro da filha dois dias após a chegada dela na nova moradia.Por falar em moradia, o casal, que antes morava em um pequeno apartamento, considerado suficiente para a vida à dois, teve que comprar uma casa maior. “Compramos uma casa com quintal para elas poderem correr e brincar”, frisou Cezar.O carro, que até então levava confortavelmente duas pessoas teve que ser trocado por outro maior, condizente com a realidade de quem agora formava uma família de cinco pessoas.Porém, nem todos os anos foram um “mar de rosas”. O processo de adaptação com a adolescente foi um pouco mais complicado. Aos 11 anos Andreina deu um pouco de trabalho para se encaixar à nova rotina e às regras da casa. Rotina essa que também teve que ser incorporada à vida dos pais.Na escola o processo também foi meio conturbado. Cezar saiu do emprego para se dedicar à nova família. Maria, por ser a mais nova, fica com o pai Cezar (maneira que as meninas se referem aos pais) período integral.Mesmo diante de tantas emoções provocadas pela paternidade, após a chegada de Maria, a ficha de Cezar demorou sete dias para cair. Diante de tanta responsabilidade, o rapaz se viu apavorado e mil dúvidas lhe passaram pela cabeça. “Quando cheguei em casa com Maria entrei em desespero. Pensei se eu seria capaz de cuidar das três meninas. Mas busquei ajuda no centro espírita e depois de uma semana me senti renovado”, esclareceu. Durante estes dois anos, desde que as meninas foram morar com eles, Cezar reclama da falta de boa vontade da Justiça em acelerar o processo de adoção. “Até hoje temos a guarda provisória. Entramos com o pedido de adoção em abril do ano passado, já completou um ano. Era para ser uma coisa rápida. Cumprimos com os prazos, mas falta boa vontade da parte jurídica em acelerar o processo”, desabafou Cezar, que aguarda ansioso para que as três crianças possam carregar o sobrenome dos novos pais.