Exame de gravidez mostra feto na barriga de uma mãe, em Campo Grande. Desde 2008, o Estado teve 557 internações de meninas com até 14 anos que passaram por procedimento de aborto. Desses, apenas 13 foram autorizados. As outras hospitalizações, que são aproximadamente 98% do total, ocorreram em razão de abortos espontâneos ou induzidos fora dos hospitais.Em outras palavras, a cada procedimento de interrupção de gravidez permitido em uma criança desta faixa etária, outros 42 ocorreram sem aval médico. Os dados são do SUS (Sistema Único de Saúde), consultados pelo Campo Grande News.As intervenções autorizadas são a minoria (2%), apesar de a gravidez nessa idade apresentar alto risco à saúde da gestante e de o aborto legal ser previsto em Lei nos casos de estupro, o que automaticamente inclui meninas engravidadas antes de completar 14 anos. Mesmo em pouca quantidade, as interrupções têm sido mais legalizadas nesta década.No Brasil, o aborto é possível em três casos - gravidez decorrente de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto. Nas demais situações, a interrupção da gravidez é considerada crime, de acordo com o artigo 124 do Código Penal, de 1940.Vale ressaltar que, desde 2009, o Código Penal foi reformulado e é considerado estupro de vulnerável toda e qualquer relação sexual com menores de 14 anos, com penalidade de oito a 15 anos de reclusão. Conforme o SUS, em uma década, o Estado teve mais de 4,7 mil adolescentes mães.A maioria das jovens de até 14 anos que foram internadas por conta de aborto no Estado, desde 2008, se autodeclaram como pardas, cerca de 58%. Em seguida, aparecem as brancas, com 29%. Mesmo que representem menos de 2% da população sul-mato-grossense, as indígenas representam 8%. Por fim, há as pretas (2%) e amarelas (1,9%).Aborto - A legislação estabelece que a mulher que provocar um aborto em si mesma pode ser condenada a pena de um a três anos de prisão. Também segundo a Lei, o crime de aborto ilegal prescreve em oito anos, considerando a pena máxima.O Código Penal fixou a possibilidade de aborto legal em caso de estupro. Já a interrupção da gravidez em caso de anencefalia do feto só foi permitida a partir de 2012, após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).A OMS (Organização Mundial de Saúde) calcula que 47 mil mulheres morrem a cada ano em razão de abortos clandestinos. Também estima que 5 milhões de mulheres por ano sofram com sequelas de procedimentos inseguros.Recentemente, o Ministério da Saúde publicou norma técnica que desconsidera a atual legislação, ao não recomendar o procedimento após 22 semanas de gestação, argumento apresentado por equipe que recusou a intervenção em uma menina de 11 anos, vítima de estupro em Santa Catarina.A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, em conjunto com as defensorias de outros 13 estados, enviou ofício à pasta do governo federal, onde questionava as orientações para o acesso ao aborto legal descritas no guia.De acordo com o órgão, a cartilha com orientações para profissionais de saúde “cria barreiras de acesso às situações já previstas em lei, ou seja, para salvar a vida da gestante se a gravidez resultar de estupro ou em caso de feto anencéfalo”.As defensorias afirmam que o guia “usa um caso excepcional de Cingapura em que um feto de 212 gramas sobreviveu para desaconselhar a oferta de interrupção da gestação acima desse limite”. Além disso, os órgãos reclamaram das dificuldades impostas pelo Ministério para a participação em audiência pública que discutiu o tema nesta semana.Denuncie - Segundo o Atlas da Violência de 2021, a maior parte (47%) dos casos de violência sexual ocorrem em crianças, adolescentes ou jovens de 10 a 19 anos. As vítimas de zero a nove anos representam 28% do total.O Disque 100 é um canal de comunicação da sociedade civil com o poder público que registra denúncias de violações de direitos humanos de toda a população, em especial de grupos sociais vulneráveis, tais como crianças e adolescentes, pessoas em situação de rua, idosos, pessoas com deficiência e população LGBTQI+.